A educação financeira deveria ser tão básica quanto português ou matemática em qualquer lugar do mundo, mas certamente isso está longe da realidade por aqui. Os dados mostram que 2 a cada 3 famílias brasileiras estão endividadas*, o que só comprova a falta de conhecimento sobre juros compostos, orçamento familiar e controle de gastos. Falar de dinheiro é tabu em diversos lugares e conseguir algum objetivo financeiro parece demandar sacrifícios sobrenaturais. E aqui entra o papel da educação financeira como ferramenta de prosperidade de longo prazo. Ajudar na redução de dívidas, evitar problemas futuros e mostrar que lidar com dinheiro não é uma coisa inerentemente negativa. Certamente o boom da internet e dos influencers digitais têm tido um papel muito relevante em levar a mensagem da literacia financeira a cada vez mais pessoas, mas ainda assim estamos longe de um mundo ideal. Nem tudo está perdido, mas precisamos promover a mudança – mas por onde começar?

O que é (e o que não é) educação financeira

Se eu fosse escrever o verbete de “educação financeira” no dicionário seria: oferecer mais informação e conhecimento sobre todos os aspectos que envolvem dinheiro para que cada vez mais pessoas possam tomar melhores decisões sobre suas finanças. E isso vai desde orçamento familiar básico, passando por endividamento, direitos e regras bancárias, investimentos e aposentadoria. Um dos desafios é que a maioria das pessoas só começa a pensar na melhor forma de lidar com dinheiro quando já são adultos, por nunca terem recebido nenhuma forma de orientação em seus anos formativos. Uma das minhas principais bandeiras é a educação financeira nas escolas, pois se nosso método educacional está baseado na ideia de apresentar a teoria antes de colocar na prática (e isso é verdadeiro para todas as profissões) por que não seguimos o mesmo modelo no relacionamento com o dinheiro?

Houve um enorme avanço nesse quesito quando a Base Nacional Curricular Comum incluiu a educação financeira em seus novos parâmetros. Porém a proposta acaba sendo empobrecida por reduzir esse tema à apresentação de conceitos de matemática financeira no ensino fundamental. Educação Financeira também pode e deve ser aprendida em História – quando falamos dos diversos ciclos econômicos que vivenciamos na nossa história, da hiperinflação e de moeda. Finanças também passa pelo ensino de geografia e a noção de globalização financeira e interconectividade dos mercados mundiais. Logo, reduzir a educação financeira à matemática pode até mesmo excluir alunos que não se sentem confortáveis com essa matéria. 

A infância e adolescência são períodos de crescimento pessoal no qual aprendemos as habilidades que usaremos em nossa vida adulto. Os jovens absorvem muito do que veem e ouvem dentro de casa sobre dinheiro, mesmo sem terem tido um ensino formal de finanças pessoais – e os adultos costumam se esquecer disso. A principal consequência é a reprodução dos hábitos financeiros majoritariamente ruins nas gerações seguintes. Por isso não só a escola deveria se abrir para falar do assunto, mas também a família – complementando um diálogo que favorece a formação de adultos melhores e mais seguros sobre seu dinheiro.

A internet e os influencers digitais

Quando olhamos para a internet, encontramos uma quantidade enorme de pessoas falando sobre investimentos e finanças pessoais. Muitos influencers fazem um trabalho excelente na promoção de melhores hábitos, mas há tantos outros que , na realidade não educam seu público. Algumas vezes as explicações sobre os investimentos são simplicadas e as recomendações generalizadas, o que pode levar um seguidor a investir em ativos que estão fora do seu perfil de risco. Alguns “influencers” ficam só vendendo sonhos e facilidades, quando não dando ou promovendo esquemas de pirâmide. Isso acaba poluindo a internet de conteúdo nem sempre de qualidade, o que pode minar ainda mais a já desafiadora tarefa de levar conhecimento para toda a população. 

Caso você veja ou tenha sido vítima de qualquer golpe ou desconhecimento financeiro, você pode denunciar para a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) que combate fraudes, recebe denúncias e faz alertas sobre golpes e empresas não-regulamentadas.

É importante sempre ressaltar que a internet pode ser uma ferramenta poderosa na informação e educação, mas que precisa ser usada com responsabilidade e analisando a qualidade do material oferecido.

Destruindo Mitos

Como já havia citado na introdução, o assunto “dinheiro” é cercado de tabus e mitos, e para promover um diálogo aberto é preciso derrubar algumas dessas ideias.

Mito #1: finanças pessoais não é um tema de interesse somente para os “ricos”.

Muito pelo contrário. O público que mais precisa de informações sobre como melhor lidar com seu dinheiro é exatamente quem ganha menos – porque educação financeira é muito mais que só investimento, é também orçamento familiar, endividamento, financiamentos e tantos outros quesitos que estão em nossas vidas diárias. Só para exemplificar, é possível começar a investir com apenas R$35, é possível renegociar dívidas e até mesmo quitá-las – tudo através da educação financeira.

Mito #2: não devemos falar de dinheiro

Ao dizer que dinheiro não é tabu eu não quero dizer que você deveria sair pela rua sacudindo seu contracheque, mas sim criar e aproveitar oportunidades de falar sobre dinheiro em espaços seguros. Nós não falamos disso em casa, nas escolas, nem mesmo com nossos amigos – então como vamos aprender? Por isso precisamos levantar esse tema em todos os espaços relevantes, como por exemplo nas empresas. Trabalho está diretamente relacionado a dinheiro, então por que não falar disso no ambiente profissional? É lógico que se torna praticamente impossível aprender qualquer coisa sem primeiro levantar o assunto, interar as pessoas sobre o tema – e para isso funcionar precisamos estar em todos os espaços relevantes.

Para isso eu criei o Multiplicando Valor que é um projeto que leva essa conversa para dentro das empresas e universidades para promover o debate e a informação, já que a educação financeira também uma forma de melhorar o bem estar dos seus colaboradores e alunos. E por ser totalmente gratuito, é acessível a qualquer pessoa ou instituição e basta entrar em contato para agendar uma data.

Hoje eu compartilhei como eu enxergo a educação financeira e como podemos mudar a situação através de diálogos abertos e informação de qualidade. O poder de mudar essa realidade está a nosso alcance e é promovido cada vez mais pelos educadores financeiros – que serão o tema do próximo texto. Me perguntaram nas minhas redes sociais como se tornar um bom educador financeiro, quais os caminhos possíveis e quais as características de um bom profissional nesse ramo. Compartilho mais sobre o assunto no próximo texto. Não percam!

Fonte: Valor Econômico

One thought on “Precisamos falar de educação financeira

Leave a comment